FORCIM posiciona-se sobre a discussão e votação da nova lei da imigração

2025-07-11
Carta do Fórum das Organizações Católicas para a Imigração (11/07/2025)
“O sinal mais eficaz para medir a verdadeira estatura democrática de uma nação moderna consiste na avaliação do seu comportamento com os imigrantes”
(João Paulo II, Discurso de Guadalupe, 04.11.1982)
Considerando as migrações como um direito humano fundamental e um fenómeno estrutural das sociedades, moldado por circunstâncias históricas, económicas e geopolíticas, acreditamos numa visão da migração que tenha presente os valores que nos humanizam: Verdade, Justiça, Paz, Liberdade, Amor (Papa João XXIII, Pacem in Terris n.35).
Na encíclica Caritas in Veritate, Bento XVI recorda-nos que: “A sociedade cada vez mais globalizada torna-nos vizinhos, mas não nos faz irmãos” (n.19). As migrações forçam a um encontro, nem sempre bem-sucedido, mas a fé, a vontade, gentileza e o perdão edificam a fraternidade e a amizade social de que necessitamos para viver e conviver nesta casa comum (Papa Francisco, Fratelli Tutti cf Cap. VI e VII).
Considerando o princípio de equiparação entre cidadãos nacionais e estrangeiros uma conquista civilizacional, consagrada na Constituição da República Portuguesa, sublinhamos que este valor reflete igualmente uma tradição milenar da Igreja, alicerçada no respeito, acolhimento e compaixão pelo estrangeiro: «Amarás o estrangeiro, porque também tu foste estrangeiro na terra do Egipto» (Dt 10, 19).
Reconhecemos o legítimo direito e dever do Estado em regular a entrada, permanência e afastamento de cidadãos estrangeiros do território nacional, bem como os mecanismos de reagrupamento familiar e políticas de integração social.
Reconhecemos o esforço que tem sido feito num curto espaço de tempo, para recuperar os processos administrativos pendentes e tornar eficiente a megaestrutura da Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA), sendo fundamental investir na melhoria dos canais de comunicação internos e externos.
Porque acreditamos que as políticas de migração devem ser orientadas por uma abordagem assente nos valores fundamentais da Constituição da República Portuguesa e nos princípios que regem a União Europeia, respeitando integralmente os compromissos internacionais assumidos, o FORCIM - Fórum das Organizações Católicas para a Imigração e Asilo – vem apelar à realização de um diálogo sereno, plural e
responsável sobre esta matéria. A credibilidade das decisões políticas constrói-se na visão de conjunto e na capacidade de escuta, diálogo e discernimento, orientadas para o Bem Comum, a Justiça e a Paz Social. É fundamental que a formulação destas políticas se faça com o envolvimento efetivo das organizações que atuam no terreno e com a devida auscultação dos fóruns competentes para o efeito, nomeadamente o Conselho Nacional para as Migrações e Asilo.
Mobiliza-nos a proximidade aos portugueses e lusodescendentes, à nossa diáspora espalhada pelo mundo, aos lusófonos, aos imigrantes, requerentes de asilo e refugiados que residem no nosso país.
É do nosso conhecimento que as propostas de alterações legislativas, que irão a debate dentro de poucas horas, já estão a ter efeitos concretos na vida de pessoas migrantes, das suas famílias e das instituições que trabalham no terreno, muitas delas da Igreja, tanto em território nacional como nos países de origem:
− Preocupa-nos, em particular, a crescente erosão da confiança das pessoas migrantes nas instituições públicas – um fator que pode ter efeitos dissuasores, sobretudo entre os trabalhadores e trabalhadoras migrantes mais qualificados, precisamente aqueles que se pretende atrair;
− Testemunhamos também o medo e ansiedade de muitas famílias, associado ao aumento crescente do discurso de ódio dirigido contra pessoas migrantes e refugiadas, tanto em espaços públicos como em
plataformas digitais, alimentando desinformação e preconceito, contribuindo para a desumanização e enfraquecimento da coesão social.
O Reagrupamento familiar, mecanismo suspenso desde 2021, é um direito humano fundamental, que já impõe condições económicas e sociais para o seu exercício. Algumas alterações nesta matéria introduzem uma desigualdade dentro da família, desregulam a imigração legal, hipotecam a integração na sociedade e a coesão social. A pessoa humana cuja dignidade deve estruturar toda a ordem jurídica não é o indivíduo isolado, é a pessoa inserida na primeira e mais básica das comunidades que é a sua família. Respeitar a dignidade da pessoa migrante significa partir desse princípio, do seu direito a viver com a sua família, sob pena de reduzirmos essa pessoa a mão-de-obra útil, ao funcionamento atual da nossa economia e às nossas perspetivas de crescimento económico.
Por outro lado, a limitação do acesso a vistos de procura de trabalho a pessoas altamente qualificadas não corresponde às reais necessidades do mercado de
trabalho e da sociedade portuguesa, levantando desafios importantes, particularmente em setores informais ou com menor capacidade de recorrer a
mecanismos alternativos de contratação de recursos humanos, no âmbito do Protocolo para a migração laboral. Reduzir o visto para procura de trabalho
apenas a pessoas qualificadas, introduz uma desigualdade que entra em contradição com as necessidades da demografia nacional e a economia do país.
É fundamental:
• mobilizar a sociedade de acolhimento para uma atitude positiva sobre a migração;
• considerar a importância da memória, da promoção do encontro, e construção de pontes para desfazer o alarme social a partir de um discurso mais assertivo
sobre o acolhimento e a integração, a bem da verdade, da justiça e da sã convivência.
Propostas:
• Garantir o efetivo direito ao reagrupamento familiar, abrangendo cônjuges, ascendentes dependentes e familiares em situações de vulnerabilidade reconhecida, como previsto na diretiva europeia;
• Investir na valorização, qualificação e requalificação das pessoas migrantes já presentes em território nacional, favorecendo tanto quanto possível a sua
integração e inclusão;
• Investir em verdadeiras políticas de acolhimento e integração em paralelo com a gestão de fluxos migratórios e controlo de processos administrativos;
• Investir em políticas de proximidade, implementando efetivos canais de comunicação com os municípios e a sociedade civil, reativando o papel fundamental da AIMA na concretização de verdadeiras políticas de acolhimento e integração;
• Investir no combate à desinformação, divulgando dados concretos sobre o impacto de implementação de verdadeiras políticas de integração na promoção da coesão social e desenvolvimento do país;
• Ativar o canal de denúncias no âmbito das competências da Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial;
• Dotar os postos consulares de recursos financeiros e humanos, formação e supervisão, essenciais para a concretização de vias regulares, seguras, eficientes
e céleres.
Reiteramos a nossa total disponibilidade para continuar a colaborar dentro das especificidades de atuação das organizações que integram o FORCIM.
Apresentamos os nossos melhores cumprimentos, com a mais sincera estima e consideração,
Cáritas Portuguesa e Caritas Diocesanas
Capelania da Comunidade dos Africanos
CAVITP – Comissão de Apoio à Vítima de Tráfico de Pessoas
CEPAC – Centro Padre Alves Correia
CNJP - Comissão Nacional Justiça e Paz
CJPE - Comissão Justiça, Paz e Ecologia
Coordenação Nacional da Capelania Greco-Católica Ucraniana de Rito Bizantino
Comunidade Católica Lusófona Esch-sur-Alzette - Luxemburgo
FAIS - Fundação Ajuda à Igreja que Sofre
FEC – Fundação Fé e Cooperação
LOC/MTC - Liga Operária Católica/Movimento de Trabalhadores Cristãos
Rede Hispano Lusa de Mulheres Vítimas de Tráfico
OCPM - Obra Católica Portuguesa para as Migrações – OCPM e secretariados diocesanos de migrações
JRS - Serviço Jesuíta aos Refugiados